Derrota cruel, falhas no fim e um gosto amargo na alma: Corinthians sucumbe ao Palmeiras em pleno coração da Fazendinha
O sábado ensolarado em São Paulo, que poderia ter sido mais uma celebração da força do futebol feminino alvinegro, se transformou em um retrato doloroso de frustração e indignação. No clássico que parou a quarta rodada do Campeonato Brasileiro Feminino 2025, o Corinthians recebeu o Palmeiras na Fazendinha e, com requintes de crueldade, viu a vitória escapar pelos dedos no apagar das luzes.
O placar final de 2 a 1 para as visitantes ainda ecoa como uma ferida aberta na alma da Fiel.
A dor não está apenas no resultado. Está na forma. Está no roteiro. Está no descaso de um segundo tempo em que o time parecia ter tudo sob controle, até se perder em si mesmo. Está na desatenção fatal, no vacilo derradeiro, na incapacidade de proteger o que foi conquistado com suor. Está em ver o rival comemorar no seu terreiro, rindo da sua angústia, enquanto a torcida, apaixonada como sempre, lamenta mais um capítulo de um enredo que insiste em se repetir quando menos se espera.
Primeiros sinais de um jogo duro
Desde os minutos iniciais, o dérbi feminino já mostrava que não seria fácil. Não que algum dia tenha sido, é verdade.
Mas desta vez, a promessa de equilíbrio virou profecia.
Logo aos dois minutos, Jaqueline fez boa jogada e cavou o primeiro amarelo do jogo, dado a Yorelli. A pressão corinthiana seguiu forte, com Gi Fernandes finalizando bem e exigindo boa defesa de Natascha. Em resposta, o Palmeiras atacou com Brena, que obrigou Nicole a se esticar toda e buscar uma bola venenosa no ângulo.
Com a posse sob controle e uma atuação intensa, o Timão dava mostras de que estava ali para ditar o ritmo. A torcida, mesmo chegando aos poucos, fazia barulho e tentava empurrar as Brabas.
A cada escanteio, a cada jogada de Andressa Alves, o grito era um só: **vai, Corinthians!**. Mas, como em tantas outras histórias, o gol insistia em não sair.
Andressa esteve perto. Em duas ocasiões, quase colocou a bola na rede. Numa delas, de voleio, por pouco não fez um golaço. Mas o Palmeiras se defendia com tudo o que tinha. E o clima do clássico esquentava a cada dividida. Gabi Zanotti, Vic Albuquerque e Gi Fernandes foram amareladas ainda no primeiro tempo. Três pilares do meio campo alvinegro penalizadas, como se o peso da camisa pesasse apenas de um lado.
O gol que acende a esperança
Na volta do intervalo, o técnico Lucas Piccinato fez mudanças. Gi Fernandes, pendurada, saiu para a entrada de Duda Sampaio. E logo nos primeiros movimentos, o susto quase virou tragédia para o Palmeiras: Natascha furou um chutão e Vic quase aproveitou. No lance seguinte, Tamires cruzou e Andressa Alves, enfim, testou para as redes. A Fazendinha explodiu. O grito preso finalmente saiu. 1 a 0 para o Corinthians. Era o começo do que parecia ser um desfecho justo.
A vibração tomou conta do time. A torcida empurrou, Andressa comemorou com alma.
O clássico, porém, não permite sossego. E foi aí que a coisa começou a desandar. Aos poucos, o Palmeiras foi se encontrando em campo. Camila Orlando, técnica das visitantes, fez mudanças cirúrgicas.
Diany, ex-Corinthians, entrou e trouxe um gás novo ao meio-campo. Em uma dessas jogadas, após cobrança de falta, Nicole operou mais um milagre. Mas o time já mostrava sinais de cansaço. As substituições do rival surtiram mais efeito.
As do Coringão nem tanto.
O golpe do empate
Aos 28, em mais um descuido defensivo, a bola foi alçada na área. Ninguém conseguiu cortar. Lais Estevam bateu de primeira e empatou. Um balde de água fria.
Um filme repetido. O 1 a 1 era um golpe, mas havia tempo para reagir.
E o Corinthians tentou. Na bola parada, no empurrão da torcida, nas jogadas individuais. Mas não era o suficiente. O time parecia mais preocupado em não perder do que em vencer.
E quando o time deixa de ser protagonista, o destino costuma ser cruel.
A tragédia no último minuto
O relógio já passava dos 45 do segundo tempo. O empate parecia consumado. Um ponto contra o rival, ainda que pouco para a grandeza do Corinthians, seria melhor do que nada. Mas a bola ainda rolava. E o futebol, esse esporte que beira o sadismo, tinha planos diferentes para a tarde alvinegra.
Falta na entrada da área. A bola posicionada. Do outro lado, Andressinha — ex-Corinthians, veja só — ajeita com calma, como quem sabe o que está prestes a fazer. A barreira está formada, Nicole posicionada, a torcida tensa. O apito soa. O chute sai. E a rede balança. 2 a 1. O Palmeiras vira o jogo no último lance. A dor é instantânea, profunda, avassaladora.
Não havia mais tempo. Nada mais a fazer. Apenas a revolta.
Falta de concentração, de comando e de fome
É impossível não se perguntar: como isso aconteceu?
Como um time com tanta posse, com tanto apoio da torcida, com uma atuação firme em boa parte do jogo, entrega tudo de forma tão desastrosa? Como uma equipe do tamanho do Corinthians permite um apagão desses no próprio estádio, diante de um rival histórico?
O problema não foi só técnico.
Foi psicológico.
Foi falta de foco.
Foi falta de fome.
Foi falta de comando.
Em momentos como esse, é inadmissível desligar. É inadmissível dar espaço. É inadmissível permitir que a vitória vire derrota por desatenção.
Lucas Piccinato terá muito a explicar.
As escolhas das substituições, a postura da equipe após o 1 a 0, a ausência de uma reação efetiva após o empate… tudo está em xeque.
A torcida cobra. E com razão. O Corinthians tem uma camisa pesada demais para aceitar passivamente esse tipo de tropeço.
O próximo desafio já bate à porta.
Na terça-feira, o Corinthians encara o Fluminense, fora de casa, em Bangu.
Mas o que estará em campo? Um time ferido, envergonhado, buscando redenção? Ou um elenco abatido, que ainda lambe as feridas do dérbi perdido?
A resposta virá em campo. Mas uma coisa é certa: a Fiel não merece mais uma atuação como essa. Não merece ver o rival vencer dentro da nossa casa. Não merece um time que se contenta com pouco.
Perder faz parte do jogo. Mas perder assim, não. Perder no último minuto, por falta de atenção, por falta de sangue nos olhos, é inadmissível. A camisa do Corinthians exige luta até o fim. E hoje, infelizmente, essa luta não durou 90 minutos.
A dor vai passar. O campeonato segue. Mas a cicatriz desse dérbi ficará marcada. Como um lembrete cruel do que acontece quando o Corinthians esquece quem é. Quando esquece que, dentro de campo, não basta jogar. É preciso lutar. É preciso vencer.
E vencer o Palmeiras, em casa, é mais do que obrigação. É questão de honra.
Ficha técnica do jogo
Competição: Campeonato Brasileiro Feminino
Local: Estádio Alfredo Schürig, São Paulo, SP
Data: 12 de abril de 2025 (sábado)
Horário: 11h00 (de Brasília)
Árbitro: Deborah Cecilia Cruz Correia
Assistentes: Leandra Aires Cossette e Marcela de Almeida Silva
Gols: Andressa Alves (Corinthians); Lais Estevam e Andressinha (Palmeiras)
Cartões amarelos: Thaís Regina, Gi Fernandes, Vic Albuquerque, Gabi Zanotti, Jaqueline e Andressa Alves (Corinthians); Yorelli e Espinales (Palmeiras)
Público: 7.842 pagantes (público total: 1.657)
Renda: R$ 150.649,00
CORINTHIANS: Nicole Ramos; Thaís Regina, Thaís Ferreira e Mariza; Gi Fernandes (Duda Sampaio), Yaya (Dayana Rodríguez), Vic Albuquerque, Gabi Zanotti (Jhonson) e Tamires; Jaqueline (Carol Nogueira) e Andressa Alves (Ariel Godoi).
Técnico: Lucas Piccinato
PALMEIRAS: Natascha (Tapia); Ingryd (Andressinha), Fê Palermo e Pati Maldaner; Rhay Coutinho (Greicy), Yorelli (Espinales), Isadora, Brena e Lais Estevam; A. Gutierres e T. Maranhão (Diany).
Técnico: Camila Orlando